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terça-feira, 19 de outubro de 2010

Nascidos da dor

Nascidos da dor
A vida, dizem, é uma incógnita. Os destinos das pessoas parecem ser os mais variados. Parecem, pois nossa percepção é limitada, ela usa viseiras.
                No princípio da existência estamos um estado de iniciação à vida e dela quase nada percebemos. Nossos sentidos ainda pouco sensíveis, limitam-se às sensações de frio, fome, dor, satisfação da saciação da fome, do frio, do sono, saciação dos “prazeres primários” da carne. Quando nascemos estamos limitados ao conforto e desconforto físico. E vamos ampliando nossos cinco sentidos centrados no eu. Não existe o tu, ele, vós eles. Primeiramente o eu e, por necessidade do eu, o nós. O bebê e a mãe, numa relação de dependência suprema para viver. Segundo Freud, é com a mãe que o bebê tem sua primeira relação libidinosa. O tempo vai passando e a relação e integração com o mundo externo vão se ampliando e formando novas impressões internas – estamos construindo e nos situando no nosso mundo interior. Alegrias e contentamento vão surgindo, criando formas, ao tempo que se contrapõem a elas o medo, e mais tarde a própria tristeza. São as primeiras neuroses, sentimentos antagônicos como gostar e odiar. Esses contrários podem gerar dor. E para que serve a dor? Enquanto seres bio-psíquico-sociais podemos dizer que a dor só serve para causar sofrimento. O sofrimento parece algo nato ao ser humano, já sua relação com o sofrimento pode ser leve, moderada ou intensa. A depender do grau de sofrimento, que é relativo à sensibilidade de cada pessoa, a dor pode ser algo tão pesado que as pessoas que a sentem podem precisar de ajuda para conviverem com ela, e essa ajuda pode existir sob múltiplas facetas.
                Na sociedade em que vivemos a dor pode estar escondida num sorriso mascarado por incontáveis lamentações e ações que a encobrem.
                Quando o ser amanhece, saiu do seu período de meras sensações, a felicidade passa a ser um sonho que só vem ou existe em raros adormeceres. As tragédias passam a existir frequentemente no interior de cada ser. Dos sonhos que se teve à realidade que se vive os motivos para a dor são incontáveis. Os sonhos que se sonha só e os sonhos que se sonham juntos esbarram no despertar torpe das madrugadas, no corpo sonolento e fraco para se levantar, mas, mesmo assim, levantamos e vamos para mais um dia que nem sempre é rotina, um dia que, mesmo sendo um dia de rotina, é apenas mais um dia onde se desvaneceram possibilidades e coragem. A visão distorcida dos acontecimentos ainda mais distorcidos leva-nos às trevas que aparecem mesmo antes do sol se por. Vivemos de semanas, fins de semanas, meses e anos, atribuímos a cada qual um significado de ilusões, pois a realidade só sobrevive com fantasias.
                Nos manicômios e CAPS da vida vemos a fragilidade humana à dor. Nos lares vemos os desajustes trazendo isolamento, discórdia e silêncio. Nas baladas vemos, em nome da alegria que nos falta, as drogas lícitas e ilícitas entorpecendo a consciência. Consciência? É a doença física ou psicológica aparece, é a dependência que assume o controle.
                Já não somos mais filhos dos nossos pais, adotamos a dor como formadora desse novo ser em que nos transformamos. 

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